Administração Pública

Receita x Gastos: quem é o
melhor dos três prefeitos?

  DANIEL LIMA - 16/02/2024

Depois de seis anos de dois mandatos cada um, faltando os dados relativos ao ano passado, qual prefeito da região pode exibir na tela de computador, em reuniões públicas e privadas, em entrevistas, onde quer que seja, os melhores números fiscais quando se confrontam Receita Total e Gastos com Pessoal e equilíbrio fiscal?

Quem disser mesmo na brincadeira que Receita Total cruzada com Gastos com Pessoal não formam um indicador que precisa e deve ser respeitado é ruim da cabeça de analfabetismo administrativo ou doente do pé de refugar evidências.  

Orlando Morando, prefeito de São Bernardo é a resposta? Ou Paulinho Serra, de Santo André? Quem sabe José Auricchio, em São Caetano?  Você vai ver em seguida que o primeiro, o segundo e o terceiro não respondem individualmente pelos dados. A longevidade de politicas públicas, entre outros fatores, constrói o edifício de gestão.

FAZENDO AS CONTAS

Adotando como estou adotando o critério de pontuação dos tempos em que os Jogos Abertos do Interior eram prioridade de cobertura esportiva do Diário do Grande ABC (onde atuei, entre outras funções, como repórter e editor de Esportes nos anos 1970), São Bernardo lidera o Ranking de Gestão Fiscal entre as três cidades mais importantes da região. Santo André vem em seguida e São Caetano em terceiro.

Não zombe da comparação, porque a sugestão é uma arma didática. Nessa competição entram três indicadores cruzados: Receita Total, Gastos com Pessoal e o Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal, como traduzi o Índice Firjan de Gestão Fiscal.

Faço esse apanhado restritivo a três dos sete municípios da região ao levar em conta as atuações dos prefeitos Orlando Morando, Paulinho Serra e José Auricchio – únicos entre os sete titulares de Paços Municipais há tanto tempo nos respectivos cargos.

CONSTRUÇÃO HISTÓRICA

Devo dizer porque é preciso dizer que esse apanhado reflete parte da responsabilidade fiscal dos três prefeitos. Os três prefeitos, afinal, não estão na praça regional desde que os três municípios mais antigos da região deram à luz os respectivos orçamentos anuais e respectivas rubricas. Eles pegaram o bonde andando.

Mas, mesmo pegando o bonde andando, o que supostamente não os atingiriam como responsáveis por quaisquer resultados, para o bem e para o mal, é preciso dizer o contrário: a movimentação dos dados de que vou tratar também tem as digitais dos três prefeitos.

Um prefeito desastroso pode, num só mandato, explodir um Município equilibrado. Não faltam exemplos no País. E principalmente na gestão do País. Dilma Rousseff é prova viva, vivíssima, disso.

Os dados são oficiais, da Secretaria do Tesouro Nacional. Não é possível contestá-los sem que o contestador caia na vala comum de delinquentes juramentados. Faço essa ressalva porque há sempre um pistoleiro pago com dinheiro dos contribuintes que, a título de suposta proteção de interesses nem sempre claros, não fazem outra coisa senão dispararem de tocais de redes sociais.

Se há uma coisa que faz parceria com outra coisa a ponto de abominar as duas coisas é a junção de mau-caratismo do chamado jornalismo profissional e o banditismo de alguns frequentadores de redes sociais. Não existe virgindade dos jornais que se pretendem puros sangues e das redes sociais sempre abertas a meliantes. Fake news não têm exclusividade de plataforma comunicacional.  

MEDALHAS IMPERFEITAS

Mas vamos ao que interessa. Nos tempos de Jogos Abertos do Interior (confesso que não sei como anda a competição e se os critérios de contagem de pontos são os mesmos), o primeiro lugar de cada modalidade valia 13 pontos, cada segundo lugar valia oito pontos e cada terceiro lugar valia cinco pontos. Esse é o caso que transplanto para o Campeonato Regional de Gestão Fiscal. Nos Jogos Abertos, o quarto lugar valia três pontos, o quinto dois pontos e o sexto apenas um ponto.

São Bernardo soma 39 pontos dos 39 pontos possíveis, Santo André chega a 24 pontos e São Caetano a 15 pontos. Os indicadores, repito, são Receita Total, Gastos com Pessoal e Índice Nacional da Firjan.

A contagem dos Jogos Abertos do Interior me pareceu sempre mais justa do que a dos Jogos Olímpicos, que reservam aos três primeiros colocados de cada prova uma medalha de ouro, uma medalha de prata e uma medalha de bronze. O problema dos Jogos Olímpicos é basicamente de calibragem dos pesos relativos de cada conquista. A modalidade de futebol, por exemplo, com 11 marmanjos (e outros mais durante cada partida) vale apenas a medalha de ouro, de prata ou de bronze, enquanto uma prova de 100 metros rasos de atletismo tem os mesmos valores na contagem geral.

TRES DE OURO

Valessem medalhas, não pontos, nessa adaptação que faço, Orlando Morando ficaria com três medalhas de ouro, Paulinho Serra com três medalhas de prata e José Auricchio com três medalhas de bronze.

De novo, vamos ao que mais interessa. E nesse caso, quando se colocam três indicadores no ranking regional, São Bernardo é mesmo e disparadamente a primeira colocada durante os seis anos dos atuais prefeitos.

São Bernardo apresentou crescimento de Receita Total menos impactante no bolso dos contribuintes, da mesma forma que os Gastos com Pessoal também foram inferiores. E, para completar, o quadro fiscal oferece segurança para o futuro que nem Santo André nem São Caetano ostentam.

Em números absolutos, São Bernardo apresenta o melhor desempenho em Receita Total. Os números são de dezembro de 2022. O orçamento da Prefeitura de Orlando Morando chegou a R$ 5.300.026 bilhões, com crescimento nominal de 47,79% em relação a dezembro de 2016, de R$ 3.586.087 bilhões.

Numa combinação de despesa com o funcionalismo público, de 23,87% de crescimento nominal, São Bernardo chega ao saldo de 23,92 pontos percentuais. Provavelmente nem o secretário de Finanças de São Bernardo tem conhecimento disso.

O comprometimento da folha de pagamentos com a Receita Total em 2016 registrava 36,75%. Já em dezembro de 2022 passou para 30,80%. Ou seja: Orlando Morando comprimiu o Gastos com Pessoal em relação às receitas. A soma de variações dos percentuais das duas modalidades em termos nominais no período é de 71,66%.

Essa combinação de Receita Total e despesa com o funcionalismo público da ativa ou aposentado é mais efetiva na medida, claro, que incide menos no bolso dos contribuintes. O critério de tornar como ponto negativo o avanço da Receita Total se aprende ao comportamento do PIB, nos três casos municipais com rebaixamento do valor monetário no período.        

DUAS COMPLICAÇÕES

Com Paulinho Serra à frente da Prefeitura de Santo André houve crescimento nominal da Receita Total de 52,31%, ante crescimento nominal da despesa com pessoal de 35,09%. O saldo é de 17,22 pontos percentuais. Entre o primeiro e o sexto ano de dois mandatos, a Receita Total de Santo André avançou de R$ 2.190.312 bilhões para R$ 3.336.129 bilhões, enquanto Gastos com Pessoal passou de R$ 883.724 milhões para R$ 1.193.838 bilhão. O comprometimento com a folha de pagamentos da Prefeitura de Santo André antes de Paulinho Serra assumir o cargo era de 40,34%. Já em dezembro de 2022 alcançou 35,79%. A soma dos percentuais de aumentos nominais nas duas modalidades (Receita Total e Gastos com Pessoal) chega a 87,40%.

Com os seis anos de José Auricchio na Prefeitura de São Caetano (a ausência no primeiro ano, em 2017, não é considerada, porque a máquina pública não sofreu mudança de direção com o prefeito interino Tite Campanella), o avanço nominal da Receita Total chegou a 55,46%, passando de R$ 1.235.170 bilhão para R$ 1.920.205 bilhão. Já Gastos com Pessoal sofreu crescimento nominal de 41,39% ao passar de R$ 464.400 milhões para R$ 656.634 milhões. A soma de percentuais de aumentos nominais das duas categorias chega a 96,85%. Bem acima de Santo André e muito mais acima de São Bernardo.

MAIS SEGURANÇA

Completando o quadro, no caso o reflexo disso e de outros fatores administrativos na saúde fiscal de cada Município, também no mesmo período, o que temos é a exclusividade de São Bernardo como modelo relativamente seguro, sempre tendo em conta que se trata de uma maratona histórica, com períodos curtos, como os seis anos recentes, de trecho importante dessa trajetória.

Sempre segundo dados do Tesouro Nacional, de 2022, São Bernardo terminou o Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal (oficialmente Índice Firjan de Gestão Fiscal, especialidade de técnicos contratados pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), na posição 682 entre mais de cinco mil municípios brasileiros. A média de pontos, 0,8565, numa escala de 0 a 1,000, colocou São Bernardo na posição 109 no Estado de São Paulo.

O Brasileiro de Gestão Fiscal leva em conta quatro quesitos: Autonomia, Gastos com Pessoal, Investimentos e Liquidez. A média geral coloca São Bernardo na Primeira Divisão do ranking nacional, além da mesma posição no ranking regional, restrito nesse caso específico aos três municípios mais antigos.

Em 2016, antes portanto de assumir a Prefeitura, Orlando Morando encontrou São Bernardo com 0,7741 ponto, com vaga na Segunda Divisão Nacional. No quesito Investimentos e no quesito Liquidez, São Bernardo conta com as menores notas, 0,8131 e 0,6130, contrapondo-se abaixo do máximo possível registrado de 1,000 ponto de Autonomia e de Gastos com Pessoal.

MAIS COMPLICAÇÕES

A situação de Santo André é bem mais complexa e preocupante quando o referencial é São Bernardo. Afinal, está na posição 2.165 no Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal e na posição 431 no Ranking Estadual. A média geral de pontos de Santo André ao fim de seis anos de dois mandatos de Paulinho Serra é de 0,6972, um pouco acima de 0,6237 que recebeu de herança do prefeito Carlos Grana, em dezembro de 2016.

Dois dos indicadores fiscais de Santo André são aterrorizantes, segundo os estudos divulgados pela Firjan: Investimentos registram nota 0,3402 na mesma escala de 0,000 a 1,000, enquanto Liquidez não passa de 0,4494. Talvez a situação fique pior quando forem conhecidos os números do ano passado. Em Autonomia Santo André soma 1,000 ponto e atinge a escala máxima, ante 0,8226 no Gastos com Pessoal.

São Caetano consegue ser pior que Santo André no Brasileiro de Gestão Fiscal, porque ocupa a posição 2.215 no ranking e o a posição 441 no Estado de São Paulo. Com média geral de 0,6901 na soma dos quatro quesitos da Firjan, sempre com dados do Tesouro Nacional, São Caetano sofre da mesma deficiência de Santo André: em Liquidez soma 0,6119 ponto enquanto em Investimentos não passa de 0,3260. Em Autonomia, chegou ao limite máximo de 1,000, enquanto no critério de Gastos com Pessoal a pontuação é de 0,8226.

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